*Rayane Peres Vilela
**Imagem em destaque:
Artista Sonia Dias Souza
Fotografia de André Nacli/Divulgação
Laços. Criados ou desfeitos. Feito nós. Esperando a aurora celeste em dia tempestuoso. Véu que encobre o céu. Céu que veste o dia e a noite. Noite que se aproxima. De mim. De você. Romance a dois. Feito vinho em dia frio. Estamos tão perto. Proximidade infinita. Como estrelas no céu. Intrínsecas. Algo me vem em mente. Teu eu em mim. Meu eu em você. Feito poesia escrita rápida. Dom. Dádiva. Não diferente de antes, mas igualmente posto como outrora a noite que se aproxima. Ora, ora. Quem sou quando escrevo? Ninguém. Absolutamente ninguém. Dispo-me. Despir. De pensamentos. De razões. Apenas emoções. E inicio a escrita. Sucinta. Às vezes. Outras vezes rende folhas e folhas. Espero ouvir. Ouço. Uma mesma música, sempre. Sempre quando escrevo. A mesma música toca. Toca-me. Toca meu ser e me coloca a escrever. Mas creio que nada sou. Não sou nada, pois como dito antes, dispo-me. Despir. E nada sobra. Nada me resta. Apenas as emoções. E então, sinto-me, bem. Se não sinto, nada sou. Compreendem? A noite, por exemplo, o que ela é? Nada? Só a vejo como emoções em formas de estrelas. Estrelas d’alma. O dia, o amanhecer, o entardecer, tudo és. Tudo és solicitado. Mas a noite é para aqueles que sonham acordados. E, ao abrir os olhos, feito de maneira eficaz e abruptamente, sentem-se acordados. Mas e eu? Nada sou, infelizmente. Sou feita da escrita que a alma me propôs. Considero-me nada, pois é assim que me veem. Julgam-me. Materializam-me. Fazem-me crer nessa “verdade”. E eu, nessa dualidade finita ou infinita entre o tudo e o nada, encontro-me. À espera de você. Feito vinho na taça. À espera que alguém o faça ser vinho. Realmente vinho. Que alguém o aprecie. Moderadamente, que seja. Ou exageradamente. Apenas por uma noite. Escravo das paixões cotidianas e repentinas. O que somos? Senão seres compulsórios e infalíveis? Algo sempre resulta. Mesmo que não seja o esperado. Esperar? “A espera traz escravidão”. Li em algum poema isso. E me tocou a alma. Não espero mais. Vou à luta. Diária. Compulsiva. Frenética. Entre o ser e o existir. Quero, não mais em vão. Ser. Quero, agora não mais como sempre, existir. Só sei que desejo. E o desejo, provém da razão ou da emoção? Caro leitor, se coloque a pensar, busque no seu conhecimento a resposta para essa última questão. E então? Quem é você? Eu já disse, eu sou nada. E desejo. Contudo. Desejo. Agora.
Outrora, a vida. Seja ela sem rimas, mas parecida com um conto. Ou com rimas, assemelhando-se à poesia. A mesma música toca. O som do piano. Sua singularidade e, ao mesmo tempo, dualidade: pluralidade infinita. Pois toco o céu ao escutar as teclas do piano em sinfonia única e transitória. Pois sei, e saber não é razão, muito menos emoção. Saber é dualidade. Transição. Se crio agora uma terceira esfera (como podem notar), é porque exijo de mim algo além, metafísico, irrestrito. Ainda não sei como chamar essa terceira e nova esfera. Mas espero declarar que a mesma te fez crer, por um instante que seja, que a vida é muito mais do que podemos pensar, do que podemos ver, ouvir, sentir, apalpar, degustar. A vida contempla três esferas, a saber: a emoção, a razão, e a terceira esfera, que posso nomeá-la como saber-vida-metafísica. Pois sabemos que existimos por termos vida e é através da metafisica que as outras esferas se fazem presente. Não sei. Ao certo. Se soube me expressar. Com as palavras corretas. Para o seu entendimento. Mas te peço, com sabedoria, que contemple a música, o elixir do piano. Suas teclas se movimentando. A mesma canção. O cheiro do vinho e sua propulsão para o além do agora. Laços. Criados ou desfeitos. Verdades. Ditas ou resguardadas. À espera de que tudo, ao meu redor, se torne poesia, não única, mas pluralística. Dançando entre os versos. Degustar o vinho que toda essa leitura propôs e sorrir. Em meio ao caos do pensamento que a leitura impôs.
Texto enviado em 01/06/2021
*Estudante de Letras Inglês EaD na Universidade Federal de Uberlândia (UFU) – 7º período.
**’Radical’ é a primeira mostra individual da artista Sonia Dias Souza. (Foto: André Nacli/Divulgação)
Comentário da autora:
O texto faz uma analogia com as duas esferas – razão e emoção – e ressurge com uma nova esfera – a metafísica, ou seja, saber-vida-metafísica – que espera do leitor um olhar crítico diante essa nova esfera e sua pluralidade constante. Ir além, é isso que o meu texto deseja. Dizer ao leitor que a vida é mais do que sentir e pensar. A vida se faz presente em tudo o que é, ou tudo o que existe. O texto também traz um tom filosófico, visando a reflexão do leitor e a minha própria. Além de trazer um tom romântico, meu conto se faz presente entre taças de vinho para degustação e um romance existente entre personagens que não lhes nomeio, mas apenas cito “meu eu em você, seu eu em mim” – alusão ao romantismo. E justamente para essa história ser recriada a partir da vida do próprio leitor. Ou seja, cada um escolhe as/os personagens para compor essa história, trazendo à tona características própria da liberdade de escolha e de expressão.